A cantora Cristina Branco relatou hoje ao Juiz de Instrução Criminal de Santarém as circunstâncias em que ocorreu o acidente na autoestrada 1 que vitimou a cantora Sara Carreira, confessando ser, ainda, “bastante penoso” recordar o que se passou.
Cristina Branco foi a única dos quatro arguidos envolvidos no acidente, que ocorreu ao final da tarde do dia 05 de dezembro de 2020, na autoestrada do Norte (A1), junto a Santarém, que quis prestar declarações no início da instrução do processo.
A cantora relatou como embateu no veículo de Paulo Neves, que circulava a cerca de 30 quilómetros/hora (abaixo do mínimo permitido por lei), tendo a sua viatura ficado virada em sentido contrário na faixa central, e as circunstâncias em que saiu do carro levando a filha, então com 11 anos, para o separador central, julgando que se deslocava para a berma da estrada.
Cristina Branco, que é acusada pelo Ministério Púbico (MP), juntamente com o ator Ivo Lucas (então namorado de Sara Carreira), de homicídio negligente, procurou demonstrar que tomou as medidas que lhe foram possíveis para sinalizar devidamente a viatura, justificando com o “instinto de proteção” da filha, e a confusão em que se encontrava, o facto de não ter colocado o triângulo.
Nas alegações, o procurador do Ministério Público admitiu que, nas circunstâncias em que se encontrava Cristina Branco, não era exigível que colocasse o triângulo, mas invocou o facto de a cantora, mesmo conduzindo dentro da velocidade permitida por lei, não ter sido capaz de imobilizar ou desviar a viatura, evitando o embate no veículo que seguia a velocidade reduzida.
Para o procurador, os factos imputados aos arguidos na acusação devem ser mantidos, não dando razão aos pais de Sara Carreira, Tony Carreira e Fernanda Antunes, que se constituíram assistentes e pediram que o crime de homicídio negligente de forma grosseira, que querem que seja imputado a Ivo Lucas e Cristina Branco, vise igualmente Paulo Neves.
O advogado dos assistentes, André Almeida, salientou que os pais de Sara Carreira acompanham a acusação do Ministério Público, à exceção da qualificação do crime de homicídio negligente, que considera assumir aqui a forma qualificada de negligência grosseira, pedindo, ainda, que esse crime seja igualmente imputado a Paulo Neves.
Além da velocidade a que circulava este arguido e de ter sido detetada presença de álcool no sangue quatro horas depois do acidente, André Almeida apontou o facto de Paulo Neves não ter sinalizado nem marcha de perigo nem, após o acidente, ter colocado o triângulo, contribuindo para os acidentes que se seguiram.
Para o advogado, se Paulo Neves e Cristina Branco tivessem colocado os triângulos teria existido uma “sinalização dupla” que poderia ter evitado os embates seguintes.
O advogado de Ivo Lucas defendeu que, tal como pedido por Cristina Branco, também o ator não deveria ser pronunciado por homicídio negligente, declarando ter “sérias dúvidas de que se possa simplesmente por de parte” a acusação a Paulo Neves.
O MP acusa Paulo Neves da prática de um crime de condução perigosa e três contraordenações ao Código da Estrada (uma leve, uma grave e uma muito grave), Cristina Branco do crime de homicídio negligente e duas contraordenações graves, Ivo Lucas, namorado de Sara Carreira, por homicídio negligente e duas contraordenações (uma leve e uma grave) e Tiago Pacheco por condução perigosa de veículo e duas contraordenações (uma leve e uma grave).
Nas alegações de hoje, o procurador considerou, ainda, que não deve ser atendido o pedido feito por Tiago Alves para extração de certidão e instauração de um procedimento autónomo de contraordenação.
Segundo a descrição do acidente, que ocorreu ao final da tarde do dia 05 de dezembro de 2020, já “noite escura” e com períodos de chuva fraca, a viatura de Cristina Branco embateu, cerca das 18:30, no veículo de Paulo Neves, o qual circulava na faixa da direita a entre 28,04 e 32,28 quilómetros/hora, velocidade inferior à mínima permitida por lei (50 Km/h), e depois de ter ingerido bebidas alcoólicas (apresentava uma taxa de alcoolemia de 1,18g/l quatro horas depois do acidente).
A viatura de Cristina Branco embateu, de seguida, na guarda lateral direita, rodando e imobilizando-se na faixa central da A1. Apesar de ter ligado as luzes indicadoras de perigo, a fadista, que abandonou a viatura, é acusada de não ter feito a pré-sinalização de perigo.
O relato do acidente constante da acusação refere que, cerca das 18:49, Ivo Lucas circulava pela faixa central a entre 131,18 e 139,01 Km/h, velocidade superior à máxima permitida por lei (120 Km/h), não tendo conseguido desviar-se do carro da fadista, no qual embateu com o lado esquerdo, seguindo desgovernado para o separador central e capotando por várias vezes até se imobilizar na faixa da esquerda, quase na perpendicular, com parte a ocupar a faixa central.
Pelas 18:51, Tiago Pacheco seguia pela via central a entre 146,35 e 155,08 Km/h, referindo-se na acusação que não reduziu a velocidade, mesmo apercebendo-se que passava pelo local do acidente, não conseguindo desviar-se da viatura de Ivo Lucas (que ocupava parcialmente aquela faixa), onde este ainda se encontrava, bem como Sara Antunes.
O juiz de instrução, Bruno Lopes, marcou a leitura da decisão instrutória para o próximo dia 27.
C/Lusa