Médicos acusados de homicídio por negligência de Marisa Nunes não vão a julgamento

Os três médicos do Centro Hospitalar de São Francisco, em Leiria, acusados de um crime de homicídio por negligência pela morte de Marisa Nunes, natural de Fazendas de Almeirim, não vão a julgamento, determinou o juiz de instrução.

“(…) Decido não pronunciar os arguidos (…) pela prática do crime de homicídio por negligência que a cada um foi imputada ou de qualquer outro crime, ordenando o arquivamento dos autos”, escreveu o juiz de instrução criminal na decisão instrutória.

No despacho de acusação, o Ministério Público (MP) referiu que, no dia 19 de julho de 2017, a utente, de 33 anos, compareceu no Serviço de Radiologia do Centro Hospitalar de São Francisco, para a realização de uma Angio TAC Cardíaca.

Após a administração de contraste iodado para a realização do exame, a utente perdeu a consciência e entrou em paragem respiratória, sendo que, durante as manobras de reanimação que se seguiram, levadas a cabo por dois dos arguidos, “estes não determinaram a administração de adrenalina à vítima, o que poderia ter revertido o seu quadro”.

Apesar de a terceira arguida, também médica, ter ordenado a administração de adrenalina, “perante a não reação da doente à dose administrada, deveria ter determinado a sua aplicação em dose superior, o que não fez”.

Dadas tais omissões, a vítima não recuperou o ritmo cardíaco passível de cardioversão, que poderia ter levado à reversão do seu quadro clínico, tendo ficado com encefalopatia anóxica, estado que foi irreversível, sustentou o MP.

A vítima foi transportada para o Hospital de Santo André, em Leiria, “sem que os arguidos a tenham acompanhado, pelo que, em consequência de tal omissão, o suporte avançado de vida foi interrompido, passando a suporte básico de vida e, por conseguinte, não foi administrado soro, nem adrenalina de cinco em cinco minutos, tal como deveria”, o que fez com que a vítima entrasse “em paragem cardiorrespiratória”.

O MP adiantou que a utente recuperou o pulso na sequência das operações de reanimação efetuadas no Hospital de Santo André, onde permaneceu internada até 18 de agosto de 2017, data em que foi transferida para o Hospital Distrital de Santarém, onde morreu em 06 de dezembro do mesmo ano, sem nunca ter recuperado a consciência.

Segundo o MP, “embora pudessem e devessem ter procedido à administração de adrenalina no tempo e nas doses que se impunham, bem como ter acompanhado a vítima no transporte para o Hospital de Santo André, o que era correspondente à boa prática clínica, os arguidos não tomaram tais medidas, confiantes de que o resultado morte se não produziria, tendo sido a inobservância dessas práticas clínicas que aumentou o risco de produção da morte da doente, o que se veio a verificar”.

Na decisão de não pronúncia dos arguidos, o juiz de instrução criminal considerou que não resulta suficientemente indiciado, entre outros aspetos, que a administração de adrenalina “podia e devia ter sido feita” pelos dois médicos e que a médica “poderia e deveria ter administrado mais doses de adrenalina” após a primeira não ter surtido efeito.

Por outro lado, também não está suficientemente indiciado que no transporte da doente para o Hospital de Santo André “pudesse ser mantido” o suporte avançado de vida à doente e que os dois médicos o “poderiam ter assegurado se acompanhassem a paciente” nessa deslocação.

De acordo com a decisão, “não resulta suficientemente indiciado que os arguidos praticaram omissões causais da morte de (…), que se impunha que agissem de modo diverso e que, caso o fizessem, o resultado morte não ocorreria”, referiu o juiz de instrução criminal.

“Face ao conjunto da prova indiciária recolhida, não resulta suficientemente indiciado que os arguidos (ou qualquer deles) não procederam com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, estavam obrigados e de que eram capazes e que tal negligência foi causal das graves lesões de (…) e da sua subsequente morte”, acrescentou.

C/Lusa