Almeirim é a Capital da Sopa da Pedra e também podemos dizer que é a Capital do Vinho…
Não direi Capital do Vinho, mas, de facto, o concelho de Almeirim, dentro da região do Tejo, é aquele que mais produz vinho na região e isso tem muita importância na sua atividade económica.
Quais são os grandes desafios para este ano e para o futuro próximo neste setor?
Eu acho que os desafios são conquistar novos mercados e, nos mercados internacionais, o objetivo passa também por continuar a crescer como temos crescido nos últimos anos.
Em que medida é que a pandemia tem afetado este setor?
A pandemia, no mercado interno, afetou muito o setor chamado horeca, pois toda a restauração fechou, como todos sabemos. Mas, relativamente aos vinhos de supermercado, nas grandes superfícies até aumentou.
Porque é que existe a ideia de que lá fora os nossos produtos não são de máxima qualidade?
A culpa é nossa e não deles. Existem dois tipos de qualidade: a qualidade intrínseca do produto, que nós temos e Portugal tem; mas depois há a qualidade que é reconhecida pelo consumidor, e é nessa qualidade reconhecida que Portugal falhou; e falhou porque deve ter andado a dormir aqui há 20 anos e não fez a sua correcta promoção. Tivemos alguns novos países produtores que nos ultrapassaram, como é o caso da Nova Zelândia, Austrália, África do Sul ou países sul-americanos como é o caso, por exemplo, do Chile, Paises que há mais de 30 anos ninguém falava neles enquanto Produtores de vinho de qualidade e que hoje em dia são países que dão cartas.
Mas nós temos vindo a recuperar algum terreno nos últimos anos em relação a essa matéria?
Temos vindo, isso sem dúvida, mas quando se fala em vinho português, na maioria dos mercados internacionais, dizer que é português não é sinónimo de qualidade.Há mercados onde isso acontece, mas são os mercados da Saudade ou são mercados lusófonos, como é o caso do Brasil ou de Angola e agora também na Polónia.
Mas nos outros mercados a concorrência é muito feroz em todo o mundo e isso ainda não acontece.
Em que medida é que este disparar de preços dos transportes da comercialização de mercadorias pode prejudicar?
O mercado da China, por exemplo, foi seriamente afetado porque o transporte de vinhos para a China é dispendioso… para outros mercados, aqui dentro da Europa, não o será tanto. Dependendo do mercado, esse custo pode afetar mais ou menos.
Há no entanto da nossa parte um percurso a fazer pelos produtores para diminuir esse impacto: basta, por exemplo, substituir as garrafas utilizadas por garrafas de vidro leve, para que os menos custos de transporte diminuam pelo facto da embalagem ser menos pesada. Temos de implementar uma série de outros procedimentos para minimizar esses aumentos de custos de energia.
Mas já estamos a trabalhar nesses aspetos?
Sim, e isso está relacionado com a sustentabilidade. Nós queremos, até final de 2025, tornar esta região bastante mais sustentável do que é. A sustentabilidade é um conceito muito amplo que tem a ver com muita coisa a atingir quer a nível social e económico, mas também a nível da produção na adega e vinhas. Para atingir esses objectivos, que a maioria dos produtores já tem em mente e alguns implementados, há que trabalhar bastante. Não tenho dúvidas de que vai ser difícil de atingir, mas é esse o caminho que nos propomos atingir na Região, no final de 2025.
Na qualidade dos vinhos, estamos a viver uma das melhores fases. Concorda com esta ideia?
Eu acho que a qualidade sempre existiu, no entanto hoje em dia há novos métodos de vinificação, há novos métodos também de viticultura e temos uma nova geração de técnicos e também à frente das empresas.
Também temos novos equipamentos, temos adegas modernizadas, e isso contribui para melhorar aquilo que já não era mau no passado. A qualidade sempre existiu e só pode melhorar no futuro.
O futuro só pode ser risonho…
Sim, desde o momento em que as metas que estamos a fixar, sendo uma delas a sustentabilidade, mas também um continuo aumento da exportação e da certificação; se tudo isso continuar, estaremos a criar um futuro risonho para a Região, como o temos feito até agora.
Está na ordem do dia a questão da seca. Isso é uma grande preocupação para fazer crescer a produção deste ano e do futuro muito próximo.
Nesta região não tanto como noutras, porque esta é uma região que ainda tem bastante água, pelo que a irrigação das vinhas pode atenuar as dificuldades da falta de chuva. No entanto noutras regiões onde a água não é abundante, como o Alentejo e Algarve, isso pode ser muito grave.
Qual o panorama que encontrou nos vinhos do Tejo, desde que assumiu este lugar, já lá vão 8 anos?
Eu já estava ligado aos vinhos do Tejo, ligado a um produtor de referência aqui da região. Era membro do Conselho Geral da CVRTejo e portanto, já acompanhava os vinhos do Tejo antes disso.
Há uma evolução, não quero com isso dizer que cheguei aqui com uma varinha mágica, não. Houve muito bom trabalho na CVR por parte das pessoas que me antecederam e nós tínhamos, não só que seguir este trabalho, melhorar um pouco alguns aspectos e internacionalizar muito mais os vinhos da região. Os resultados estão à vista: Arriscámos bastante em 2014, 2015 e 2016; e os resultados não surgem logo, mas, de facto, passámos de uma Certificação de 11,5 milhões de litros para uma certificação de mais de 30 milhões em 2021. Relativamente á exportação, cresceu desde 2015, em média anual e até ao final de 2021, 15,5% ao ano. Em 2015 para os dois maiores mercados que tínhamos não exportávamos de mais 500 mil. Hoje em dia, temos cinco mercados de um milhão ou mais litros e só um deles coincide com os maiores mercados de 2015. Angola por exemplo, que chegou a ser o nosso maior mercado, começou em 2015 a entrar numa crise muito grande e, se não tivéssemos nessa altura decidido diversificar os mercados, os nossos objetivos da exportação tinham sido um desastre, porque Angola caiu a pique. Medimos o êxito dos mercados, não só pela litragem que é vendida mas também pelo preço médio que os vinhos são vendidos e também pelo número de produtores ativos em cada mercado.
Quando conseguimos ter num dado mercado, 10 ou mais produtores ativos, que vendam no mínimo 10 mil litros, isso significa que esse é um mercado onde podemos estar mais descansados porque já é sustentável em termos de notoriedade da Região e de vendas e os produtores de per si, podem prosseguir a sua actividade que o mercado continuará a crescer sustentadamente. Enquando não quando atingimos essas metas, temos de tentar continuar a apoiar acções de promoção e a investir nesses mercados. Infelizmente, como sabe, as verbas não são infinitas e os recursos que temos esgotam, portanto temos que ter algum cuidado para apostar correctamente onde e como os dinheiros para a promoção são aplicados.
É esse um recado também para nós: vamos ter um novo governo daqui a poucos dias e também no setor político?
Não damos recados ao setor político. Eu posso dizer que nós dependemos de facto um bocado do IVV ( Instituto da Vinha e do Vinho), mas a nossa relação com o Instituto tem sido ótima, o IVV tem sido para nós um parceiro e não um inimigo e, nesse aspeto, estamos bem.
Não tenho grandes razões de queixa, a não ser as normais em que as apreciações e aprovação de projectos, por exemplo, acontecem lenta e tardiamente, mas isso acontece connosco, como acontece com todos, portanto, não podia ser só eu a queixar-me e já entrou, infelizmente, num hábito Nacional, digamos assim.
Os vinhos do Tejo estão bem e recomendam-se?
Estão bem e recomendam-se. Normalmente nesta altura do ano (fevereiro) temos uma reunião de apresentação do plano de promoção para Portugal e estrangeiro com toda a região. Infelizmente, já no passado tivemos de a fazer via zoom e este ano também será via zoom o que não é a mesma coisa porque diminue a interação entre os participantes, mas as pessoas já estão habituadas a essas plataformas, e já não correm tão mal com no início.
Já falou na Certificação, que tem vindo a aumentar de ano para ano. Mesmo em anos de pandemia, quais são os dados, relativamente a 2021?
Em 2021, certificámos mais de 50% do que produzimos nesta região que, grosso modo, produz, 60 milhões de litros por ano e portanto nós já ultrapassámos os 30 milhões de certificação. Em 2015, certificávamos apenas 11,5milhões de litros de vinho. Estes valores eram manifestamente baixos, não quer dizer que estejamos contentes com o que acontece agora, porque o nosso caminho é chegar à totalidade do vinho certificado, dado que o consumidor já reconhece que o vinho certificado pode ter um preço diferente e é bom o produtor poder vender os seus vinhos um pouco mais caros e com maior margem de lucro. Todos os nossos Produtores estão cientes disso e portanto creio que a certificação irá continuar a crescer.
A esta região têm também chegado novos investidores, isso é um ótimo sinal.
Sim, já têm aparecido novos investidores, novos players, e isso é bom. Há pessoas que já têm produções noutras regiões ou que iniciaram aqui essa actividade pela primeira vez. Nós temos um caso de um investidor francês que adquiriu uma empresa de referência aqui, por acaso em Almeirim, e que nunca tinham investido no setor dos vinhos e o resultado está à vista pois já cresceram bastante nestes últimos dois anos e é, de facto, um dos produtores de referência desta região.
Estamos em Almeirim, uma terra com muitas adegas e produtores que estão incluídos também neste projeto de enoturismo lançado pela rota e a CVR Tejo. Gostaria que falasse um bocadinho mais deste projeto ‘Tejo Wine Route 118’
A Região parece não ter valorizado suficientemente o seu potencial turístico, o que é uma lástima. Estamos muito perto de Lisboa, que é o maior centro populacional de Portugal e também onde há mais fluxo de turistas estrangeiros. Todos sabemos que vir de Lisboa a Santarém demora, no máximo, uma hora, até menos do que isso, portanto, é uma zona fácil de visitar. É fácil vir de manhã e voltar à tarde ou vir à tarde e ficar na Região para visitar o que a Região tem para oferecer ao Turista Nacional e Estrangeiro.
Esta Região tem um fantástico património histórico, arquitectonico e paisagístico que deve e pode ser visitado e que, aliado á sua boa Gastronomia, aos seus Vinhos ás Quintas onde são Produzidos e a uma inúmera possibilidade de outras ocupações ( Bird Watching, Equitação, O Rio Tejo, etc…) preenchem todos os requisitos para uma boa visita .
A Wine Route 118, a antiga estrada nacional 118, tem perto de 150 Km dentro da região, começa a sul na «Companhia das Lezírias» e tem como último produtor, já perto de Abrantes no Tramagal, o «Casal da Coelheira». Mas são ao todo 14 os Produtores de referência da região que existem ao longo e junto a essa estrada; por isso faz todo o sentido que se tenha criado essa Wine Route. Parte desses Produtores já têm a sua oferta Enoturistica desenvolvida outros estão a desenvolvê-la. Tudo isto não se faz de um dia para o outro, porque não se põe tudo isto a mexer e a ter sucesso por decreto mas com empenho e o trabalho de todos, e é um trabalho que pode demorar algum tempo, mas acredito que vai ser um êxito, e daqui a três anos a Wine Route vai ser uma realidade e as pessoas vão usufruir do melhor que a Wine Route tem para oferecer.
Há novas rotas, ou iniciativas conjuntas previstas para este setor?
Vão existir novas rotas, mas mas não dá para fazer tudo ao mesmo tempo porque há muitos locais de interesse, esta ‘wine route’ é uma delas. Nós temos aqui muitos locais de interesse e esta região é bastante ampla, como sabe, vai desde Rio Maior, até Coruche, abrange Tomar, Abrantes, Azambuja … e é uma região muito diversificada com Santarém como pólo central. Vão ser criadas novas, mas entendemos que era bom esta ser a primeira.
A CVR Tejo tem apostado muito também na casta Fernão Pires, mais expressiva na região. É para continuar?
Sim, sem dúvida, porque a casta Fernão Pires é casta rainha da região, em termos de brancos e o Castelão em termos de tintos. É uma casta muito versátil pois temos espumantes com base Fernão Pires, assim como temos vinhos de entrada, vinhos com madeira, sem madeira e até temos vinhos de sobremesa e aguardentes.
É uma casta que permite excelentes vinhos e aguardentes até e não tenho dúvida que os nossos produtores vão continuar a apostar nesta casta.
A adesão tem sido boa?
Sim, sem dúvida, e vai continuar, e nós também temos em mente um projeto de vinhos brancos que ainda não podemos revelar, que queremos implementar internacionalmente e que pode também ajudar um bocado a uma muito maior divulgação da casta Fernão Pires.