Maria Carolina Sirgado e a importância do voluntariado

É a mais nova de uma família de 4 filhos. Como foi ser a “caçula”? Fale-me um pouco da sua infância.
Tive uma infância única e cheia de amor. Como me dizem lá em casa: a
nossa “Bambina” ou Pisca mais nova.
Ser mais nova deu-me oportunidade de ter uma aprendizagem da vida muito mais profunda, uma vez que os meus irmãos sempre me integraram
no desenvolvimento pessoal deles. Sempre tiveram muita preocupação
comigo e me apoiaram nas atividades em criança, como o gosto de cantar
e escrever canções quando participei em eventos em Almeirim. Tanto
os meus pais como os meus irmãos, tiveram muita influência em várias
decisões da minha vida e isso não tem preço. Por vezes, tenho saudades
desse aconchego dos irmãos porque somos muito unidos desde sempre.
A passagem pelos Escuteiros no 404 Almeirim foi uma escola de vida onde
os irmãos “Pisco” marcaram uma época.
É importante salientar que, desde pequena, os meus pais sempre apoiaram
os meus projetos e iniciativas e decisões para a vida. Eu digo muitas vezes
que preciso de ouvir a voz familiar para sentir-me na plenitude, porque
eu sei que eles vão estar lá sempre para me levantar quando for preciso.
A minha avó, que perdi em 2018, a única, uma mulher fantástica que sempre esteve na minha vida, tal como o meu tio, e foram o porto de abrigo que admiravam imenso a neta e sobrinha que se destacava pelo amor à música e por querer sempre ajudar os outros. Lembro-me da minha avó
Ricardina dizer muitas vezes: “nunca te arrependas do bem que faças ao
próximo”.

Desde cedo que a sua vida está centrada no “outro”. Sempre sentiu este
apelo?

O Ser Humano é um ser em projeto. Este apelo veio desde criança por influência da minha mãe que desenvolveu um trabalho mágico no mundo
dos meninos especiais e das famílias com diversas carências, na qualidade
de Educadora de Infância, que lutou muito pelo verdadeiro significado da Solidariedade e onde desenvolveu o seu trabalho nas várias escolas do
concelho.
Este apelo foi desenvolvido e aprofundado ao longo da minha caminhada. Lembro-me de participar no OTL- IPJ e muitas vezes ia fazer trabalho na
área da terceira idade (no concelho de Almeirim). Defendo que o outro, ao longo da minha vida, tem sido a minha inspiração para tudo o que tenho construído para a sociedade.
Não podemos esquecer que todos somos um ser com necessidades, um ser
em crescimento, um ser em relação e um ser de decisão. É, sem dúvida, o ponto de partida para tudo o que tenho desenvolvido ao longo da minha vida profissional.
Muitas vezes digo que é necessário sentir um profundo “Strani Amori” para mover montanhas e enfrentar obstáculos nesta passagem chamada “vida”.

Trabalha desde 2006 na ACDTIU e tem levado a cabo vários projetos no
âmbito do serviço social e do voluntariado. Que projetos são estes?

“Não tenho poderes pra ser um super-herói e salvar a humanidade. Mas tenho dignidade para contribuir para o bem da humanidade e construir
pontes.” (MCS). Todos os projetos são um desafio na minha vida. Projetar obriga-me a investigar, estudar e contactar com outras realidades.
Todos os projetos que desenvolvi são um pouco de mim e de todos os
que fizeram parte dele. Destaco o Fora D´Horas – luta contra Fome e Desperdício Alimentar, que nasceu a 11 de dezembro de 2008 – um projeto que hoje tem importância enorme na organização onde trabalho há 14 anos e na vida dos colaboradores que são os voluntários deste projeto.
O mesmo já ajudou outras IPSS do concelho. É uma mais valia para muitas famílias nesta altura que estamos a passar, com a pandemia da Covid-19.
Outros projetos: O Coaching Care – “Mais que cuidar é Preciso Sentir” – Formar Cuidadores Informais e Cuidadores Formais; a iniciativa “Ajudar
não tem Hora Marcada” – Angariação de EPI´S e Produtos Alimentares; o projeto “Vem Reciclar para Causas em Movimento” 2013 – Angariação de
papelão para ajudar a ACDTIUNHOS – foi muito giro entrar no mundo
da reciclagem; a “Viagem ao Fundo de Ti” – Desenvolvimento Pessoal – desenvolver competências do EU! e a “Gulbenkian Cuida/ Covid 19 – Projeto
Fora D’Horas”.
Desenvolvi muitos projetos para o BNP Paribas no âmbito da responsabilidade social “Mão ao Quadro” – ACDTIUNHOS que ganhou durante 4 anos seguidos apoio financeiro.

Já foi distinguida com o Troféu Português de Voluntariado com o seu projeto “Fora de Horas”. Que significado teve este prémio para si?
Teve um significado muito importante, uma vez que veio provar que
temos que ousar ser criativos, aceitar que a vida todos os dias coloca à prova as tuas capacidades enquanto cidadão e profissional e esta distinção veio dizer ao mais fundo de mim: “não tenhas medo de desafiar a sociedade, o mundo e dar o chamado grito”.
Eu tenho uma missão neste mundo por isso faço algo que acrescente valor
e que possa mudar, não só a vida de uma Organização, mas também a
vida de muitos indivíduos.”

Mete muita energia e dedicação em todos os projetos e iniciativas em que se envolve, com uma preocupação permanente de envolver todos os setores da comunidade. Qual é o maior retorno que tira desta entrega?
Pode parecer estranho, mas o único retorno que tiro é que todos os projetos ou iniciativas que desenvolvi até agora acrescentem valor à vida das
pessoas e que tenham ajudado a comunidade e a Organização.
Sejam felizes e façam a diferença!

Saiu de Almeirim ainda muito jovem, mas não esconde o amor que sente pela terra que a viu crescer. Está nos seus planos regressar um dia?
Saí para ir para a Faculdade em Lisboa e no fim ainda tive oportunidade
de voltar às origens quando fiz Estágio Profissional no Centro de Bem
estar Social da Glória do Ribatejo. Bons tempos!
Gostava imenso de voltar à minha terra-mãe, porque tenho saudades
de olhar as lezírias, que transmitem a paz e a verdadeira essência de uma
terra.
Tenho saudades dos meus pais, dos meus amigos, do sossego da minha
terra, de andar a pé e sentir essa liberdade que aconchega a alma.

Como é estar na linha da frente em
tempos de pandemia?

Estar na linha da frente, em tempos de Covid, é um desafio complexo. Costumo dizer à minha equipa que não há lugar a medo, não há lugar a dor.
Trabalhamos sete dias por semana e quando vamos para a rua temos que
transmitir aos nossos utentes muita tranquilidade e, muitas vezes, somos
as únicas visitas que têm.
Temos o projeto “Nós levamos tudo”, onde levamos desde a alimentação, à
medicação, ao receituário, marcamos a consulta e a mensagem que queremos passar é: “Eu estou contigo!”
Na ACDTIUNHOS, para além de diretora técnica e assistente social, assumo
também o papel de ajudante de ação direta, sempre que é necessário. A minha origem ribatejana faz-me enfrentar “o touro pelos cornos”. A
Covid-19 não é mais forte do que eu e o meu propósito é levar dignidade,
paz e segurança a todos os meus utentes.

Desejos para 2021…
Os meus desejos pessoais é que venham novos projetos e desafios profissionais e muita saúde e força para continuar a enfrentar a Covid-19.
Também desejo que esta pandemia faça repensar muitas coisas no nosso
país, nomeadamente políticas sociais e económicas. Que tenhamos a coragem de enfrentar a vida como o forcado enfrenta o touro, agir com atitude, pensar com conteúdo, projetar com visão, não ter medo de cair e que coloquem sempre paixão em tudo que fazem na vossa vida!